O QUE QUE EU VOU FAZER COM ESSA TAL LIBERDADE?
Os otários de sempre, mesmo se achando contra nós, farão o serviço todo acreditando nisso e ainda defendendo a censura alegremente...
“Fascistas”, “Milícias Digitais”,
“Discurso de ódio”não!
Autor não Identifi-
cado (melhor assim...)
(adaptação da crônica Projeto I de Millôr Fernandes, do
livro “Que país é este?”.
O que que eu vou fazer com essa tal LIBERDADE? Como no pagode dos anos 90, as eminências
pardas, por vezes nem tão pardas mas fosforescentes, fizeram essa pergunta após
o resultado inesperado de uma eleição na Terra Média. E decidiram exterminar a
LIBERDADE de vez, para que nunca mais pudessem ousar contrariar a torcida dos
arautos da mentira, dos falsos numerólogos e dos pretensos iluminados.
Se houve uma reunião para isso, deve ter sido como o XX Congresso
Internacional de Sataniqüidades que o velho Guru do Méier, o saudoso Millôr,
narrou em “Que país é este”.
Primeiro precisamos inventar algo para deslegitimar essa burra escolha
popular, algo contramajoritário, que deixe a Sociedade aberta somente à
nossa voz– falou o Diabo, com sotaque magyar[1], declarando
aberto o evento.
Um espírito imundo logo sugeriu que podiam falar que boatos (hoax,
em inglês) a fraudaram. Mas um ente
malfazejo logo acrescentou: não! Precisamos de uma expressão nova, que
pegue logo, para fazer os modinhas ficarem repetindo. Foi então que um anjo das trevas teve
uma idéia que o fez sentar à esquerda do senhor das trevas (sim, ele sempre
valorizou a esquerda: ai de quem estiver à direita...): por que não culpamos as
“fake News”? Um demonete quase
queimou de emoção satânica e, envolto em uma nuvem de enxofre, lembrou: temos Zamiel,
Arumã, Asmodeu cujas notícias, valorizada$$$ em todo o mundo podem se
tornar verdade oficial; e ainda temos mais os tanecos, íncubos, súcubos,
menores, mas que sempre seguirão as tendências satânicas.
Não só eles – berrou diabolicamente um bruxo: temos todos aqueles
anjos beiçudos que por quaisquer 30 dinheiros fariam de tudo para
atrapalhar governos que teimassem em defender a Liberdade.
Não fala essa palavra desrespeitosa aqui – gritou guturalmente o Diabo!
30 dinheiros é coisa que saiu de moda, ninguém quer ficar com uma corda
no pescoço, hoje eles preferem um ái-fone... disse uma alma sebosa.
Eis que surpreendentemente, surge um cramulhãzinho estagiário e
mostra que tem uma grande e tenebroso futuro pela frente: temos que atribuir
todo esse ódio que sentimos a eles, acusando-os do que fazemos e xingando-os do
que somos, como os velhos mestres ensinam... Vamos dizer que essa ralé
conservadora e que defende liberdades pratica discurso de ódio, que são
fascistas, intolerantes, milícias!
Os otários de sempre, mesmo se achando contra nós, farão o serviço todo acreditando
nisso... e ainda defendendo a censura alegrememte...
Continue assim e você será efetivado, cramulhãozinho! Que idéia magnífica! Após isso só precisamos
detalhar melhor como fazer, disse o Diabo que, ante os olhares submissos
das falanges infernais presentes,
acrescentou com sorriso maligno: fiquei muito satisfeito com o resultado
desta primeira reunião. Se planejarmos
direitinho, ou melhor, esquerdinho, nos painéis de hoje e amanhã, daqui a
quatro anos eu prevejo que jamais perderemos o controle novamente e
garantiremos meu reino, que é deste mundo, secular, laicista!
Nos tais painéis do congresso, acatando a sugestão de uma alma penada
que acabou promovida ao inferno, decidiram cobrar os contratos de umas almas de
certos bilionários – que as haviam vendido em troca de sucesso e dinheiro
– exigindo que cumpram sua parte e acabem
de vez com a liberdade nas redes sociais, garantindo a palavra apenas aos que possuírem
a marca da besta, ou aos que são tão bestas que nem percebem a censura e
o autoritarismo, acreditando que é “para o bem maior”...
E então, encerrando o bem sucedido congresso, todos os seres das
trevas se levantaram, cheiraram uma carreirinha de enxofre e amoníaco e,
juntos, subiram à superfície, vestindo agora roupas brancas fizeram uma
passeata pela paz, pela harmonia, exibindo sorrisos simpáticos e, dando um
abraço gigante em uma imensa lagoa: soltaram pombas brancas e cantaram Imagine, o hino de seu mundo
ideal...
No hell below us
John Lennon.
(não mais below,
mas na
superfície,
around toda a Terra Média)
P.S. As denominações das espécies e nomes de demônios usados foram,
quase todas – exceto cramulhãozinho e alma penada – copiadas da crônica Projeto
I de Millôr Fernandes, tão rica em demonologia e parafraseada neste
texto obviamente ficcional.
*Crux Sacra Sit
Mihi Lux / Non Draco Sit Mihi Dux
Vade Retro Satana / Nunquam Suade Mihi Vana
Sunt Mala Quae Libas / Ipse Venena Bibas
(Oração de São
Bento cuja proteção eu suplico)
Adriano
Alves-Marreiros
Cronista, pessimista, Mestre em Direito, membro do MCI e MP Pró-Sociedade e autor da obra Hierarquia e Disciplina são Garantias Constitucionais, da Editora E.D.A.
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[1] Língua húngara: a única que o
Diabo respeita segundo Chico Buarque.
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