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Brasília,03/12/2023

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Direita . . . Volver!

Ou: Favor Definir o Que é “Democracia”...


Direita . . . Volver!


"Ou você é a favor da democracia e contra a ditadura, ou é o oposto disso". - Revista Oeste

Gaslighting: manipulação psicológica de uma pessoa a fim de intimidá-la.   


Leio, com apreensão, que o governo ameaça prender quem falar ou for contra a democracia -- sem definir o termo. Ao mesmo tempo, vejo e ouço o presidente lançar mão do truque mais desgastado do comunismo soviético -- taxar de fascista quem for contra a democracia, sem definir “fascista” ou “democracia”. (Vale repetir aqui que União Soviética significa União Democrática, e que, como tenho alertado, a democracia é o portal do socialismo, lição que aprendi com Marx e Mao Tse Tung.)  



Do outro lado, vejo, com pesar, a declaração da revista Oeste, acima, indicando impensadamente que a “direita” consente em mover-se no campo retórico de quatro linhas criado por aqueles que visam destruí-la – ambiente em que a própria palavra “direita” é um insulto lançado pela “esquerda” para deprimi-la. Sem definir “ditadura” e “democracia”, os editores da revista parecem ter sido vítimas da tocaia grande engendrada na seara vermelha de seus adversários, em que “democracia” refere-se não ao constitucionalismo liberal ou ao Estado de Direito, como levianamente se imagina, e sim ao “centralismo democrático” de Lênin. Neste, o Partido Comunista (como o Führer do Socialismo Nacional alemão e o Duce do fascismo) “representa” a Nação, portanto a vontade e opinião do povo -- e quem discorda é “inimigo do povo”, sendo ou fuzilado, preso ou enviado a campos de “reeducação política” por trabalho forçado. Ameaça semelhamte foi feita, semana passada, na Alemanha, onde o governo prometeu punir quem falar contra a democracia – mais uma vez sem definir o que é “democracia” e quem são os “fascistas” que a rejeitam.   



Apesar dessas notícias lamentáveis, tudo indica que a renascença das concepções liberal e conservadora nas últimas décadas está causando desastres no Boulevard da Inevitabilidade do Socialismo (a implosão do Império Soviético foi o primeiro exemplo), e que as esquerdas unidas do mundo tentam, por meios ilegais, impedir o colapso de sua ideologia moribunda. Elas não lembram que o marxista Noam Chomsky coloca Lênin e Stalin na categoria Fascista. O desespero é tal que, outro dia, um petista clamou, em voz alta, pela matança de toda a “direita” brasileira. A este ponto chegamos sob a bandeira da democracia indefinida, “flexível”.    

O cativeiro semântico oculto nesse nesse baralho de significados – “democracia”, “democrático”, “fascista”, “progressista”, “direita”, “esquerda”, etc. – inventado pelos socialistas e estimulado pela superstição democrática, tem confundido tanto conservadores quanto liberais, como se, ao defenderem a democracia, eles se referissem à mesma coisa em que insistem Lula e seu Partido Totalitário (PT). Tempo de corrigir a prova antes de entregá-la. Abaixo, para o bem do povo e a felicidade geral da Nação, um exame rápido do significado de democracia e a razão por que a maioria dos filósofos, historiadores e cientistas políticos de peso em toda a história a tem condenado. 

Antes, porém, um pano de fundo. O termo gaslighting vem de uma peça de teatro de 1930 depois transformada no filme Gaslight (À Meia Luz), de 1944: o enredo mostra um criminoso que acusa sua esposa de insanidade por não concordar com ele. O termo reapareceu em 2017 quando um crítico de Trump o trouxe à tona para acusar o então presidente de estar enganando o povo americano ao dizer que os críticos de seu governo baseavam-se em notícias falsas (fake news). De praxe, os próprios críticos de Trump aplicam o gaslighting e as fake news contra quem não exalar pelo menos um leve aroma de democracia socialista.



Como bem sabem os filhos da Guerra Fria, as fake news chegaram às raias da perfeição nas mãos do KGB da saudosa União Democrática. Eis aí o objetivo da democracia indefinida, “relativa”: promover o “centralismo democrático” mediate acusações e notícias falsas contra o adversário. (“Você é feio”, me disse uma petista paulistana em 1982 ao saber que eu lia todos os jornais e revistas, e não apenas as publicações da “esquerda”.) Quem não concorda é visto ou como inimigo a ser vigiado e reprimido, ou pelos menos como vítima de lavagem cerebral (sugestão recente de um ministro do STF); espera-se que, no mínimo, o “fascista” se autocensure. A investigação do significado de palavras-chaves do debate pseudopolítico fica proibida ou, melhor ainda, permanece oculta. A imobilização mental causada pelas acusações e indefinições rende juros para a “construção do socialismo”.           

 Varrida a poeira partidária, vamos à questão da idolotrada democracia desnuda, e porque examiná-la em detalhe não é crime, e sim obrigação e dever do cientista político. Lembro ao leitor que, em outra ocasião, comparei a democracia à prostituta sagrada dos fenícios:



uma espécie de Pretty Baby de Canaan que prometia aos bilionários do Oriente Médio uma conexão espiritual, no auge do prazer, com Astarte, a deusa do amor. Os ricaços da época pagavam aos sacerdotes do templo dessa divindade pilhas de ouro para se acasalarem com aquela jovem numa sala vedada por cortinas de seda. A esse ponto chega o absurdo da superstição.  

Mas vamos adiante. Tendo escrito as linhas acima, deparei no YouTube com o vídeo Why Socrates Hated Democracy (Por que Sócrates odiava a democracia). O pai da filosofia occidental, julgado pelo oráculo de Delphi o homem mais sábio de Hellas, foi, sob acusações falsas inventadas pelos líderes do partido democrático de Atenas, condenado à morte por uma maioria de quatro votos numa assembleia de 500 “juízes”. (Etimologicamente, “democrático” significa demagógico: isto é, aquilo que “guia” o povo.) Eis aí a essência da democracia: numa assembleia ou no STF, uma maioria de um voto basta para justificar a condenação de um inocente à morte; um deputado, blogueiro ou programa de TV ao ocaso; um ex-presidente à ineligibilidade -- ou para levar um país ao desastre do dia para a noite. Essa é a razão por que os tiranos em construção defendem a democracia, que, na ausência de uma Carta ideal, torna-se “relativa”, subvertendo a ordem e a justiça de uma nação.  

Sócrates, deve-se lembrar, não defendia o governo minoritário; apenas que os governantes fossem competentes e probos, e servos da lógica constitucional implícita no nomos. Platão, seu discípulo, recorrendo a Sólon via Heródoto, distingue entre democracia (governo da maioria) e isonomia (igualdade de todos perante a lei). O autor de A república tenta resolver o problema da competência, para votar ou para governar, pela exigência de décadas de educação em filosofia e artes liberais (“música”), e capacidade professional e administrativa, em busca da sabedoria; e ele equipara o “homem democrático” àquele que põe a mão em coisas que não lhe pertencem. Seu aluno Aristóteles pensa que os jovens não devem ter direito ao voto porque carecem de experiência de vida. (Daí a necessidade de estadistas num Senado não partidário.) E, alerta o pai da lógica e da ciência politica, “uma democracia não equivale a uma constituição porque seus atos carecem de aplicabilidade geral”; pois a prova de maioria eleitoral, verdadeira ou falsa, abre portas à parcialidade e, aponta ele, às tentativas de estender mandatos a qualquer custo. Todos os historiadores da Antiguidade concordam que a democracia é um mal porque ela gera demagogos. 

Kant, em sua Metafísica da moral (1785), adverte que a “vontade do povo”, da qual o candidato lança mão para se eleger e se manter no poder, é temporária e se dissolve quando essa suposta vontade é satisfeita -- sendo, portanto, inconfiável como base da justiça e da integridade do Estado. [(Em Capitalismo, socialismo e democracia (1942/2020)], Schumpeter demonstra que a vontade do povo não existe, e que, mesmo se existisse, causaria desigualdade e conflito, e não igualdade e paz, conforme promete a suposição democrática.] Por outro lado, escreve Kant, a “opinião do povo” é estável e duradoura, pois se refere aos fundamentos da justiça, àqueles “sentimentos morais” estudados por Adam Smnith e vistos por David Hume como acessórios da política verdadeira: por exemplo, a condenação do furto e do homicídio tem sido unânime em todas as civilizações. 

From the Diary of John Adams - McSweeney's Internet Tendency


John Adams, o segundo presidente dos Estados Unidos, conhecedor da História e um dos grandes liberais americanos do passado, alertou em um discurso perante a Academia Militar de West Point (a AMAN americana) que todas as democracias da história cometeram suicídio. Atenas e Roma são os dois grandes exemplos; mas há outros, como os próprios Estados Unidos da América, historicamente em conflito interno e hoje em clara decadência, rumo ao burocratismo socialista criado pela expansão gradual do pequeno mas insaciável germe democrático-eleitoral inserido ingenuamente no Artigo I de sua Constituição. 

Em Direito, legislação e liberdade (Visão, 1985), Hayek, o maior filósofo liberal do século XX, condena os excessos da democracia eleitoral, que subvertem os fundamentos do constitucionalismo e da justiça, promovendo a ideia de que, uma vez eleito “democraticamente”, um “representante do povo” pode fazer o que lhe aprouver. É o que ocorre no Brasil de hoje, mas também, como dissemos, na Europa e mesmo nos Estados Unidos, onde tem havido constantes tentativas de usar maiorias eleitorais em prol da “justiça social” (no vocabulário oculto: o comunismo). Bom lembrar mais uma vez que Hitler, na Alemanha, e Allende (admirador do regime cruel da Coréia do Norte), no Chile, foram eleitos democraticamente, levando em pouco tempo seus países às dificuldades que conhecemos. Este é o precipício do qual nos estamos aproximando por meio da democracia indefinida, “flexível”, em que todo decreto-lei ou maioria de um voto é “lei”.         

    Sabendo dessas dificuldades de definição, o que sobra da democracia -- da ideia ingênua, confusa, improvável, de fato estúpida, de que a democracia é o governo do povo, pelo povo, para o povo? Em sua análise da democracia, Schumpeter conclui que “o povo jamais governou, não governa, e jamais governará”. Pode, então, haver uma democracia de consenso, longe dos deprimentes conflitos partidários que observamos e do tipo “eleição não se vence; se toma”? 

Primeiro, é preciso enfatizar que há poucas instituições genuinamente democráticas. Uma delas é o Direito tradicional, se aplicado igualmente a todos, a nobres e plebeus, a governantes e governados, independente do tipo de regime, conforme ensina o suíço Benjamin Constant. Outra é o mercado, em que, comprando ou abstendo-se de comprar, todos os agentes econômicos, produtores e consumidores -- mesmo a criança que exige um Lanche Feliz no McDonald’s – “elegem” o vencedor daquela semana. Um eleição “política”, ao contrário, reflete apenas 10 ou 12 por cento do “povo”. Em 2012, por exemplo, Barack Obama foi reeleito per cerca de 22,26% dos 42% dos aptos a votar que, cansados de seu desgoverno, compareceram às urnas; portanto, cerca de 7,46% do “povo” de “seu” país. Ou seja: na prática, a democracia partidário-eleitoral é antidemocrática, o que confirma, por outros meios, a conclusão de Aristóteles.

Segundo, é obvio que, sob as Cartas do período 1891-2023, a democracia de consenso tem sido uma ilusão. Não só foram essas cartas escritas de modo a conferir poder aos partidos, em detrimento da população, como também a democracia partidário-eleitoral não sobrevive a tal consenso. Quando não eleva criminosos ou déspotas ao poder, o processo democrático tende mesmo assim a produzir hábeis “mascates” partidários, insuportáveis, quando não repugnantes, e não estadistas. Como aponta Schumpeter, o processo democrático depende da “manufatura” e “guia” da “vontade” do povo mediante hábeis mentiras disseminadas pela mídia ligada aos partidos e pelo candidato em campanha; o gaslighting e as fake news lubrificam a máquina eleitoral. Criar conflito de classes, raças e hábitos, e acusar o adversário de maldade, pintando ao mesmo tempo para o povo um retrato imaculado de amor aos pobres e injustiçados, é essencial à vitória. Mais: um partido não representa o povo; seu sucesso depende de dinheiro, e a parte significativa dessa base de capital tem que vir dos sindicatos patronais e trabalhistas em troca de favores e ilegalidades, conforme ensina a teoria econômica da opção pública, que rendeu a James Buchanan o Prêmio Nobel em Ciências Econômicas de 1986. 

Nota final. Vivo nos Estados Unidos, e descobri, a duras penas, que essa confederação de estados tem vivido sob aquele despotismo benévolo, estultificante, disfarçado pelo ópio partidário-eleitoral, descrito por Tocqueville em A democracia na América. Sei, por experiência própria, que, como insistiu o falecido comediante George Carlin no final de sua vida, “este país foi comprado e vendido há muito tempo”, e que a maioria dos políticos dos dois partidos (que também escolhem os juízes) estão sob influência e dependência dos interesses organizados que financiam suas campanhas e reeleições; eles não se importam com a liberdade, a justiça, o bem-estar ou a prosperidade do povo americano. Anos atrás, quando fui pedir um favor a um senador do meu estado, ele se desculpou, com um sorriso, por não poder me attender, porque estava atrasado para ir a uma convenção de banqueiros em Miami.           

Ninguém precisa concordar com o que foi dito acima. Porém, é inaceitável ver juizes, políticos, militares e jornalistas falarem em democracia como se fosse uma coisa com acepção única, compreendida por todos, de definição indefinida porém intocável.    


Pode então haver uma saída para a situação deprimente e perigosa a que o Brasil foi levado? Pode haver um outro tipo de democracia? Já exaurimos o espaço permitido. Convido todos a lerem meus dois livros recentes, que tratam do assunto: O Estado de Direito: Constitucionalismo, democracia e o futuro da nação (Chiado, 2019) e Por uma nova Carta:Mensagem à nação brasileira (Armada, 2022). O primeiro aborda ligeiramente as bases da política liberal. O último oferece elementos de reconstrução nacional. Boa leitura.  





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